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Em Macaé grafite é arte tratada por marginais como atitude marginal

Posted in Articulistas, Cidadania, Macaé, Matheus Thomaz by ImprensaBR on 21/08/2012

Por Matheus Thomaz*

Na última semana de julho, aconteceu em Macaé o 2º Encontro Kolirius Internacional de Grafite. O encontro reuniu artistas grafiteiros de algumas partes do mundo e do Brasil. O evento foi, conforme consta no material de divulgação, realizado pela prefeitura municipal. Teve ampla cobertura da imprensa e das TV’s locais. Acredito que uma das finalidades de se realizar um evento como esse na cidade seria impulsionar a atividade localmente.

O Grafite ganhou força no início dos anos 1970 com movimentos tanto na Europa quanto nos EUA. No Velho Mundo, foi impulsionado pelo movimento do Maio Francês de 1968, onde a juventude se expressava com citações poéticas e políticas. Já nos Estados Unidos vem do gueto negro e chicano e com muita influência do Hip-Hop. Em ambos os casos são gritos contra opressões e violências, por isso o grafite exprime uma crítica. Além desse contexto social, têm um simbolismo de dar vida lugares da cidade antes mortos pela urbanização. É uma arte que possui uma beleza lúdica, com cores vivas e revolucionárias.

Macaé é um município que cresce de forma acelerada e desordenada com uma industrialização forte nos últimos anos. Passou de uma região praticamente rural no final da década de setenta para um pólo da indústria do petróleo, concentra a maior parte da produção nacional e apresenta cada vez mais sinais das contradições no bojo dessa transformação: pobreza aparente, violência e muitos novos ricos. Os royalties do petróleo transformaram a cidade. Que padece com uma especulação imobiliária feroz que movimenta milhões na cidade de belas praias.

E foi aqui, nesse contexto e cenário que se reuniram artistas grafiteiros do mundo e do Brasil. O Evento aconteceu na periferia da cidade em muros vizinhos ao Batalhão de Polícia e foi realizado pela prefeitura municipal. Ilustrado, o poder público impulsionando uma atividade crítica e reflexiva da juventude de viés transgressor e perspectiva transformadora, mas algum significado há de ter essa realização tão próxima à sede da polícia militar.

E agora a tragédia, em menos de duas semanas um grafiteiro, Yuri Alves Neves, jovem de 22 anos é morto com um tiro pelas costas durante tentativa de grafitar um imóvel abandonado no outro lado da cidade, em uma das regiões mais valorizadas pelo mercado imobiliário macaense. Foi uma legítima tentativa de dar vida a uma casa abandonada que terminou em morte pela estupidez armada.

Mas como é possível existir, num local cujo m² é dos mais caros de Macaé, casas abandonadas que transformam uma cidade de belas paisagens naturais em fotografias sombrias de abandonos lucrativos.  Essa casa provavelmente deve ter um dono, cuja principal serventia é ter seu valor especulado para se conseguir uma boa grana, para esse dono, e depois de vendida. Quando inventadas pelo homem a habitação tinha no principal sentido de sua realização de existência ter alguém morando dentro dela. Reinterpretada pelo capitalismo se fez normal deixá-la vazia, abandonada, até que atinja um bom preço e se torne uma oportunidade de negócio. Processo também conhecido como especulação imobiliária.

E assim mais um jovem entrou para as estatísticas de violência. É preciso que haja investigação séria sobre a autoria do delito, nossa justiça seletiva não pode deixar impune isso. Uma vez que a suspeição da autoria do crime recai sobre um perfil de cidadão, pertencente a uma classe social que não costuma sofrer condenações e punições da justiça brasileira. Um tiro pelas costas não sugere qualquer tipo de enfrentamento. Certamente se ouvirá das vozes do senso comum típico da aspirante a burguesa classe média conservadora brasileira que pensaram se tratar de um bandido. O que não dá nenhuma autorização a nenhum cidadão de atirar e executar outro, conforme sabido por todos não há pena de morte no Brasil.

A cidade de Macaé precisa mais da vida colorida, pulsante e revolucionária da arte urbana do grafite, do que do aspecto sombrio de casas e terrenos abandonados ao léu, mas protegidos de perto por armas mortais.

*Matheus Thomaz é assistente social e articulista do jornal O Polifônico desde sua fundação, em 2009.

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